segunda-feira, 23 de dezembro de 2019

POTENCIALIDADE




Posso te dar palavras,
aquelas que espantam
falsa e momentaneamente
os monstros inventados,
os abismos abertos
a toda passo e direção.
Posso te dar presença,
ternura, do meu corpo
teu abrigo na noite,
meu hálito, o sumo
da vida que me habita,
entranhas e células
maduras a te alimentarem.
Posso cantar para te dormir,
vestir-me de sereia, cigana,
arrastar-me em fantasias
de menino, voar teus vôos.
Só jamais conseguirei
agasalhar a solidão
da tua alma:
dor incurável, indivisível,
inalcançável, ardendo
única
no teu universo.

segunda-feira, 9 de dezembro de 2019

NO SAL DA NOITE




Adentro até minha parte insana
e encontro apenas respostas.
Parto tão breve como chego,
aparto-me o quanto me aproximo,
corto os pés nas lanças que espalho
deliberadamente, algoz e vítima
do meu próprio delírio.
Não desassocio a sede de vida
do meu estado de poesia
e faço alimento incondicional
o que retenho e me basta assim.
Incompleta e desajustada
agora recolho o vestígio do que sobra
e junto aos grãos acumulados
protegidos por uma só crença
(será possível, será possível...)
Anestesio as feridas com o sal da noite
e me convenço, irá passar.  Durmo então.
Não descreiam os amantes,
nem desdenhem os tolos,
maturo o que despertará em tempo
e ainda gritarei como Maiakovski:
Ressuscita-me!  Nem que seja
porque te esperava como um poeta.
Ressuscita-me! Nem que seja só por isso.
Quero viver até o fim o que me cabe!