quinta-feira, 9 de dezembro de 2021
E DEIXAR VIR...
Restou a
claridade inútil
de se saber
lesado por algo,
capacidade
para tolerar
erros e
perdas cotidianas
e a posição
quase imposta
de
assistente e pensador.
Restou ainda
vontade de falar,
fazer versos
sem rimas,
um sonho que
ainda não foi
e a
percepção de um olhar amigo
sem tolices
ou fantasias.
Restou agora
um tempo de não fugir,
de recolher
culpas e reminiscências
e deixar
vir... o que vier
segunda-feira, 6 de dezembro de 2021
CARÊNCIA
Que a vida nos proteja
e ampare nossa carência
e toda fragilidade seja
cuidada com decência.
Que seja tateada tal pétala
e não abatam o que sente
feito lixo, coisa anômala,
dispensável, incoerente,
exposto e discriminado,
vulnerável, confinado
na falta de condução.
Sozinho, contentável
com migalhas, restos,
à mercê do indubitável,
dos caminhos opostos,
da atenção permutável.
Que haja delicadeza
ao se tocar nos carentes,
não transfira rudeza,
pois existem precedentes
na lida do seu trajeto.
Se nada podes doar,
não o tornes objeto
até descobrir se bastar.
domingo, 5 de dezembro de 2021
terça-feira, 23 de novembro de 2021
AURA
Quem sabe estivéssemos salvos
se aprendêssemos a contestar
os inevitáveis dias tristes
e cativos
quando nos deixamos
acinzentar.
—A mescla de cores que de
nós emana,
denuncia sem assentimento
os sutis
reveses do conflito que se
entranha
mas que enlaça salvadora
matiz—
Pois tem cores a íntima harmonia
que se sobrepõe à luta dos
dias,
e respondem com voraz
alegria,
explodem na aura luzes,
poesias.
Quem dera a vida só obedecesse
às reais cores que deveras
a definam,
e que o amor ainda
enternecesse
os cinzas corações que declinam
domingo, 21 de novembro de 2021
RESPEITO
Respeita o meu silêncio.
As marcas do meu rosto,
ignora,
os retratos do que vivencio
acumulo na caixa de
pandora.
Nem me avisa da falta de
reboco,
do cio acobertado pelo
descaso,
armadilha estranhada em
desfoco,
fingida defesa dita que transvaso.
Respeita a minha revolta.
Porque tudo parece
estagnado
e improdutivo e mesmo solta,
depois do caminho explanado,
ainda quebro as pedras da
estrada.
Respeita o cansaço que
arrasto
pelos tempos e tanto me
degrada.
E por isso eu te conto: desgasta.
Assisto às cenas e quase
decoro
as frases de efeito dos
mercadores,
dos estoicos e
dissimulados, demoro
a reconhecer os
escarnecedores.
Fecho-me em copas,
contundida.
Quando a morte me ronda
disfarço
e finjo que posso buscar
acolhida.
No eixo da minha mãe me
ressarço.
Respeita minha pose fetal,
daqui um pouco eu nasço.
Que me componha mesmo letal
um resto de luz, me refaço
naquela que sempre guardo
para as emergências.
Somente
ao perceberes como um dardo
o brilho nos meus olhos, veemente,
esquece meus pedidos
anteriores.
Se possível me enfeita de
flores
e me abraça de corpo e
alma.
sábado, 20 de novembro de 2021
DA AUSÊNCIA DA BOCA
Fizeram-me acostumar a
calar.
Arquitetei e desgastei
argumentos
insistentemente, inutilmente
quando fingiram não ouvir.
Ondas refletem
infinitamente,
incorporam mansamente
a emanação massacrante
das alheias feridas
ostensivas.
Cauterizo com subliminares
e determinações
conciliadoras
nas entrelinhas das
orações.
Reciclo a névoa, recomponho
pensamentos, lapido em
poesia.
Grita mais alto na minha
mudez,
a voz que vem de dentro.
sexta-feira, 12 de novembro de 2021
CONFISSÃO
Porque eu necessitava falar
das árvores utilizei as cascas.
Eu me vi afoita à argila moldar,
gerei formas, símbolos, súplicas,
risos, imagens e poesias sentidas.
Registrei riscando as paredes,
ensaiei nos rabiscos, desenhos,
transcrevi multidões e virtudes
a bondade e a maldade dos cenhos,
e das sombras e feras as investidas.
Busquei nos recursos da natureza,
o papiro cortado em lâminas,
os segredos enrolei com firmeza
e distintas surgiram as páginas.
E porque busquei a longevidade,
as letras em pergaminhos agrupei.
Na pele dos animais, praticidade!
Areia, plantas, gorduras, testei,
penas e pedras. Nomeei as cores
e as tintas, complementei figuras,
retratei as histórias e as dores,
a hereditariedade nas escrituras.
Confesso. Uma noite sonhei,
em uma sala imensa estava.
De parede a parede avistei
volumosos e desgastados livros
que a alta estante ostentava.
No centro, uma mesa de madeira
pesada, escura e bancos inteiros.
No silêncio, sob vistosa bandeira,
de túnica marrom vestidos
e as cabeças encobertas,
seres introspectivos, calados,
na penumbra. De mentes fartas.
Eu era um velho, mais um deles.
No barulho de máquinas acordo,
descrevo fiel, almas e metrópoles
e pelo computador transbordo
a rapidez dos meus pensamentos.
Humilde escriba pelas vivências
obedecendo à sina dos tempos.
Hoje faço livros. Coincidências.
Escolhida e amada continuidade.
quinta-feira, 4 de novembro de 2021
GLÓRIA
Glória é brindar a prima
luz da manhã,
quando a noite concedeu-me
a poesia
de beleza e de crueza, quase
heresia,
recepcionada por minha
euforia pagã.
Glória é relembrar o tempo passado
e ter consciência de que
tudo vivido
foi intenso, e até o pouco
dispersado,
decretei fiel como impulso
absorvido.
Que me absolva a vida do
que não fiz,
não condene outros pela
culpa máxima
e não abdique de ser a
sempre aprendiz
na utopia do perfeito ou de
obra-prima.
Glória, permanecer nesse
estado alfa:
tenso, sereno, constante e
inconstante,
tão aproximada do que
aquece a alma
e domina, transborda
liberta, exultante.
E nesse compasso incerto e
insano,
misturado no conformismo e
glória,
comungando o divino e o
profano,
sigo registrando a minha
história.
sábado, 30 de outubro de 2021
APONTAMENTO
Na justeza dos ciclos
nem tudo faz sentido
ante prováveis vacilos
e arrebatamento contido.
Obedeço a predestinação
de um desordenado e tosco
desejo, desprovido de ação,
onde inquieta me enrosco.
Resta-me a construção
do que teimosa arquitetei.
Apontamento da agenda
amarelada onde aportei
um sonho como senda:
não esquecer de viver
sábado, 23 de outubro de 2021
NA PERSEVERANÇA
Existiu obstinado um trajeto,
guia interno (assim nascido?).
Contra um desígnio abjeto
de perecer ao preestabelecido,
tal qual Prometeu me
apossei
do fogo dos arrebatamentos.
Inebriada me arremessei
tola, a absorver desalentos.
No desvario dos impulsos,
busca a razão a prudência.
No íntimo, desejos
dispersos,
envoltos em transcendência.
Deixei-me exposta à
vontade,
à fome insaciável dos
abutres,
lido às vezes com a
insanidade
e com ímpetos
transgressores.
Protejo-me então,
autoaliança.
Cansei da atuação
tolerante.
Não sendo Deus ou uma besta
norteia-me o ofício perseverante.
Uma resignação infinita que
gesta
na escolhida solidão a
temperança,
a renovação perene da esperança.
SOM TENTADOR
No som do vento me retenho.
O que intenciona arrastar?
A tristeza ou o que detenho,
a minha euforia devastar?
A fúria dele me confunde.
Do meu encargo arredio
por mais que força redunde,
me alarma esse tom fugidio.
Leva-me a prados macios,
que seja, não mais resisto.
Não importa se devaneios
arrasta-me de vez, insisto.
quarta-feira, 6 de outubro de 2021
SEM DESILUSÃO
Que não cesse o ato silente
ao aplacar o voo desandado
do teu imaginário indolente.
Aventura-te no ritmo acelerado
e não afrontas o que se
mostra
insolente, só vês o que te apraz.
Olha-me e recebe o que
frustra
sem adequação na pressa
voraz,
encara o desafio de ir adiante.
Margeia as minhas
imperfeições,
entende, releva o
discrepante
julgamento das contradições.
Consente o ser que me
habita
em essência, sem desencanto.
Permite o mistério que orbita
o sonho nos unir em
acalanto.
Acolhe e aceita, doerá
menos,
quem sabe em vida somemos.
segunda-feira, 27 de setembro de 2021
ACEITAÇÃO
Acomodo-me sob as pedras
que eu, audaz e placidamente
permiti perdurarem por eras,
nem um pouco estoicamente.
Invento ímpares argumentos
que articulados sem retórica,
representam meros fragmentos
de infindável absorção teórica.
(Prostração? Uno-me às metáforas
para explicar minha pseudo-sandice.
Imponho-me palavras desafiadoras,
beirando, misturando-se à pieguice.
Teimo em ser a água que circunda)
Resvalo nas pedras sem agredir
em borbulhação vasta e fecunda.
Vivo limo moldado até me fundir.
quinta-feira, 23 de setembro de 2021
DISTÂNCIA
Meus extremos hoje
percorri.
A distância entre eles
condensa
eternidades. À indução recorri,
abrandei minha ira nua e
intensa,
esvaindo-me perdida em
pranto.
Acarinhei clemente meu
coração,
entoei de lembrança doce
canto,
voltando ao meio em
prostração.
Colhi a primeira flor de
primavera
e enfeitei os cabelos,
forcei o riso.
Respirei esperança, será
quimera?
MANACÁ
Seu nome vem acompanhado
de nome de flor, flor da
serra,
do perfume doce embrenhado
no verde úmido, filha da terra.
Entoa um saber ancestral,
quando destila imperiosa
mágico cântico atemporal
de entonação harmoniosa.
A emoção que nova imagina
sempre foi semente contida,
gerada incauta ainda menina
entre quintais, terra
batida,
colo de mãe, risos de
irmãos,
anéis de Saturno e
estrelas,
correndo em fogo, desvãos,
seguindo borboletas
singelas.
Esperou amadurecer o hino
e florescer a prima palavra.
Aceitou seguir seu destino
transformando o que lavra.
Transbordante em poesia.
Salve, mulher plena de amor
que envolve em sinestesia
e emociona com primor.
Salve, mulher generosa
que abraça as que foram
e as que virão. Alterosa,
encanta as que afloram.
Salve Janete Manacá!
quinta-feira, 16 de setembro de 2021
PRISMAS
Jamais
será a mesma
a
minha leitura da tua,
o
que me ensimesma
é
o tanto que perpetua.
Sendo
mulher escancaro
meu
peito em devoção,
não
denuncio desamparo,
nem
dispenso a emoção
ao
que chega e é bem-vindo.
Vem
o sorriso instintivamente,
descortino
a energia fluindo,
correspondo
explicitamente.
Não
meço acima abaixo em olhares,
não
peso tuas moedas, sigo errante,
ouço
atenta se quiseres teus pesares,
concordo
em ser na cena a figurante,
não
limito espaços, não fixo morada.
Sou
estrela, sou afago, sou desafio
sou
acolhimento, mesmo ignorada,
sou
enfrentamento, luzeiro de pavio.
O
código recebido é certeiro
e
rápido, num olhar, intuitiva
na
impressão do toque sorrateiro,
percebo
argumentação efetiva.
Já
me conforma a tua ignorância.
Tudo
perdoo, possibilito, relevo,
nem
te engrandece a tua sapiência,
será
mais uma face que transcrevo.
Somente
me espanta quando vês tudo
com
desconfiança e como te agarras
ao
rancor impregnado. Não me iludo
com
o teu fastio, ostensivas amarras,
o
teu cenho cerrado, tua amargura.
Pelos
mesmos caminhos passamos
cientes
do que fere e transfigura
e
dos dias o quanto desperdiçamos.
E
bem enumero as flores esmagadas
entre
pedras e vendavais e pranto,
derramo
em poesias transmutadas
o
invisível quase abafado canto.
Colhes
o que é escolha de captação:
só
enxergas o espinho que craveja.
A
minha leitura de mundo é estação.
Aprenderás
melhor um dia, reveja.
Despe-te
do que te enganou,
terás
a lista do que te seduziu,
o
que no tempo infeliz soterrou,
e
a falsa língua que te traduziu
tão
perdidamente, erradamente,
a
mensagem preciosa da vida.
quarta-feira, 15 de setembro de 2021
ABSTRAÇÕES
Quisera que das ideias
inatas
prevalecessem sãs
finalidades,
que mentes duras e
putrefatas
não arquitetassem
atrocidades.
Que vingasse a máxima
criação:
o sagrado, a vida nos
presenteou,
um sonho absoluto de
perfeição
do etéreo originou e
norteou.
Quisera muitos seres se
unissem
num pensamento regenerador,
onde as intenções
cumprissem
a obra divina do amor
salvador.
Ouçam homens de boa vontade!
Busquem, creiam na força
maior,
lutem com vigor na adversidade,
germinem e vibrem paz interior.