domingo, 30 de maio de 2021

INCONCLUSIVA IDENTIDADE


 

Imersa na memória coletiva circundo,

aprimoro e recolho  tantos  saberes,

nem sempre entre os fazeres aprofundo

o que poderia ser sorvido em aprazeres.

 

Volto à memória da vida em versatilidade

colhida e sugada. Nas prateleiras os livros,

em cada página um espelho, a cumplicidade,

em cada personagem o rumo de escombros.

 

A conotação vívida,  a secura do momentos,

mas também a caminhada nas entrelinhas,

encontros decisivos, do todo,  fragmentos,

ideias despejadas sutis como que adivinhas.

 

Não me pertence a caução nem a certeza

do que se acumula a cada reverso da vida.

Não me remete a estrada a qualquer clareza.

Em muitos instantes, nocautes, a face lívida.

 

Muitos me trazem espelhos de luz vadia,

a esses imploro que se apaguem no limbo.

Mas rememoro depois , sensação tardia

do que é preciso reciclar,  mesmo o findo.

 

Deixo à desconstrução o que poderá ser

a minha identidade, a definição conclusiva.

De nada servirá agora o que eu me impuser,

obedeço ao incógnito, a rebeldia recessiva


sexta-feira, 28 de maio de 2021

MATURA


Já vesti a fantasia do cárcere,

dilacerei a vontade e a carne,

debati-me até consentir

e levar-me à estagnação.

Já entoei um canto negro,

toquei pés frios e impotentes,

exagerei a culpa imposta

até esquecer qualquer reação.

Agora basta!

Preciso da fantasia

do inesperado.

 

sexta-feira, 21 de maio de 2021

PALAVRA


 

SINCERIDADE


 

Não se inventa

a necessidade

de rito, de afago,

de tato, de abraço.

Não se inventa

prímulas

florescendo

em manhãs de sol,

nem o arrepio

do toque intencional,

inconsequente.

Não se inventa

o brilho

que ilumina a face

e afasta o aperto

do cinza crepúsculo.

Não se inventa

o descompasso

da emoção,

nem a vontade

de te respirar.

Não se inventa

a ausência

que machuca,

nem o amor

que transborda

nesse

nem sei mais

o que pensar.

Não nos inventamos.


sexta-feira, 7 de maio de 2021

MÃES



Mãe, sabes quem sou eu?

E aí, lembro,  me olhavas intensamente,

no mais fundo da nossa cumplicidade.

Eu entendia quando consumadamente

esfregava as roupas com passividade,

dias e noites com mágoas e lágrimas,

com zelo, em qualquer clima. Eu vibrava

quando cantavas numa língua de rimas

que eu pensava adivinhar. Imaginava

tua dança quente do tempo das paixões,

quando decerto fazia sentido sentidos

aflorados a toques, calor,  hálito, ilusões,

aos poucos gerando desejos contidos.

Eu me aproximava atenta da tua história.

E nas noites de gritaria tremedeira e pavor

e o silêncio depois,  jamais se restauraria

o pensamento, só escondia  aflição e dor.

Tudo o que te pertencia eu sublimava.

E as despedidas, as faltas e os porquês,

o que nunca teria resposta e somava

ao meu engasgo ante as razões torpes.

Mãe,  sabes  quem sou eu?

Porque hoje eu me vejo muito em tudo

que em ti eu via e procuro juntar as peças

desse quebra-cabeça áspero e pontiagudo,

infinito carregado de mesmas desavenças.

Por razões que ainda desconhecemos

mesmo assim, repetidamente tentamos

nesse rodamoinho que chamamos vida.

Mãe, sabes quem sou eu?

Porque nem eu sei mais. Igual exaurida.

Tal nossas antecessoras, luta repetida.

 


 



 

quarta-feira, 5 de maio de 2021

TODAS SOMOS




Há muito mais de um ano

as vidas foram inseridas

nas malhas de um plano

de esperanças recolhidas,

de absurdos, no descaso.

Há mais de um ano variam

as armas, macabro retraso,

a devassidão. Procriam

as mentes ensandecidas,

sob a violência simbólica

das palavras escarnecidas,

pela regência diabólica.

Há muitas mães que choram

pelo retrocesso dos insanos,

nos corpos que impactaram

assassinados  pelos tiranos,

ceifados pela ignorância.

Vencido, o sangue escorre

entre o poder da ganância.

Há mais de um ano se morre

e se subsiste na ignomínia.

Sem sorrisos  hoje resistimos,

somos todas Dona Hermínia.