quarta-feira, 27 de janeiro de 2021

CIVITAS


 


 

Com urgência, para que seja baixado

o nível alteradíssimo do cortisol basal

decorrente fatal e cruel do multicausal

mal que domina implacável e universal,

recomenda-se que exista ainda espaço,

e que se mostre em um bem apertado

encontro de organismos, de peito colado

por visguento e quente suor misturado

ao calor, e que invada com estardalhaço.

Não aplicar paliativo recurso genérico

e se o intento for virtual, que acompanhe

verdadeiro e concebido verso lírico!

Que não haja suspeita nem se estranhe

quando exposto de traço assimétrico.

Tudo fluirá na recepção e se assanhe:

perdurará eternizado esse abraçamento

e reinará a lembrança rica do momento.

Fusão necessária esse brilhante enlace

que tem abrangente dom e incandesce

as profundezas da alma. Tudo floresce

sob o poder celestial de um forte abraço.


sexta-feira, 22 de janeiro de 2021

INIQUIDADE


 

A cada seis minutos

uma partida. Vem de amigos,

filhos, irmãos, ininterruptos

soluços inibidos de afagos.

A cada seis minutos

forçosas duras despedidas,

corações perdidos em lutos

por sementes desprendidas.

A cada seis minutos

a validação da fragilidade.

Pela imposição dos brutos,

os seres em vulnerabilidade.

A cada seis minutos

sangra um peito agoniado,

estuário de fatos propostos,

sequelas do ódio irradiado.

A cada seis minutos,

a constatação vil do poder,

lançando embustes funestos

para a perversidade esconder.

A cada seis minutos

a insensatez mostra o escárnio,

da irresponsabilidade os frutos

dos quem pregam o extermínio.

A cada seis minutos

vários Pilatos lavam as mãos,

o mal espalha seus produtos

determinando esforços vãos.

A cada seis minutos

o desfecho, a dor, o desespero,

avalanche de sonhos proscritos

e vidas valendo menos que zero.

A cada seis minutos

a urgência de propósitos absolutos.



quinta-feira, 21 de janeiro de 2021

SALA DE ESPELHOS


 

Quando fatalmente adentrei

na temida sala de espelhos

derramei-me em fragilidade.

Desacertos e projeções listei,

imperfeições e ressonâncias.

Disfarcei que não vi, ignorei

o conhecido, os conselhos,

lancei-me às adversidades,

exigi, permiti abrangências.

Arrisquei-me no atrevimento

ao circunstanciar paradigmas

que cruelmente desnudaram

um longo ciclo de infâmias?

Exercitando o discernimento,

deflagrei profusos estigmas

que, na essência, consolidaram

o amargo de ações abstêmias.

Quando enfim me bastarei?

Quanto em mim contentarei

oferecendo o colo às aflições,

vendo no outro a prioridade?

Dá-me, espelho, aspirações,

apenas na luz a legitimidade.

Que a imagem estampada

na compaixão subestimada

não imole a minha verdade.

Faça sentido o que silencia,

o que segrega a ignorância,

de mim mesma liberta-me,

o autoagrado desperta-me.

Na minha face a unicidade!

segunda-feira, 11 de janeiro de 2021

DAS MINHAS LETRAS


 

Despretensiosamente eu tento

não classificar o que escrevo

mas me espanta o que invento

uno-me à emoção e me atrevo

 

Descubro permissiva narrativa

nas entrelinhas dos meus versos

na passagem aberta e imperativa

denunciam segredos dispersos

 

Também sublimo sutil drama

e por mais que eu force o riso

espelha o íntimo que derrama

artimanha usada em desaviso

 

Procuro me nortear no lírico

e recriando cruéis realidades

o que imito de modo empírico

reflete amores e fatalidades

 

Que planejo fazer? Não imponho

e vêm em avalanche as palavras!

Enquanto penso que as componho

soberbas juntam-se em metáforas

 

Iludo-me ao crer que as domino

se tresloucadas se embrenham

dentro, fora, no que descortino

e são fiéis ao que testemunham!

 

Solto-as então! Que sejam livres

e sujeitas a que outros ao lerem

determinem apesar dos pesares

os valores do que elas proferem


domingo, 10 de janeiro de 2021

DA APLICAÇÃO DA PALAVRA


 

Há que se ter cuidado

jamais no ócio jogada

nem leva o infundado

aceita-a sacramentada

 

Adota o hábil recurso

de atentar para regras

não macula o discurso

por confundir as letras

 

Fizemo-nos incumbidos

da excelência da escrita

nos deveres envolvidos

está a cautela irrestrita

 

Ao buscar a veraz ideia

completa de elegância

imagina o que encadeia

notícia sem procedência

 

Depois lança aos ventos

o verbo o teor o sujeito

todos os complementos

dentro do verso o efeito

 

Expressada com maestria

tem um prisma inspirador

a palavra plena de poesia

encerra poder restaurador



sexta-feira, 8 de janeiro de 2021

PRIMEIRO LEGADO AO OUTRO


 

A ti, que passaste por mim,

delego o meu melhor sorriso

consentido em todas as horas

(Não te contarei da tristeza,

guardada a sete chaves

nas entranhas ressequidas)

A ti, que passaste por mim,

transfiro o exasperado fervor

a entregas sem medidas

(Não declararei os recuos,

nem os caminhos tortuosos

e os inconfessáveis ardis)

A ti concedo sem medo

a nudez despudorada

da alma perpetuamente

reciclando e renascendo,

a fé cega nos amanheceres

(As mortes, as levarei comigo.

Incensarei todas as noites

em vigília de exorcismo)

Na querência de plenitudes

corri contigo e pousei suores

em virgens leitos e em pétalas

depositei o calor do alento.

Ouvi e absorvi tuas agonias,

por isso te nomeio herdeiro.

Permite que o meu desejo

se imponha ao teu próprio,

e com a minha sede beberás

e toda a fome será saciada

com o frenesi que pede a vida.

A ti, que passaste por mim,

ostentarei copiosas palavras

prolongadas em desatino,

cravadas em redundância.

Todo êxtase será perdoado.

O fruto inegável, o âmago,

o vivido e o quimérico

do amor gravado no coração,

a ti confiro integralmente.

Eu mesma deserto,

desabito aparatos,

já me abortei de mim.

Eternizo agora em ti.