domingo, 9 de fevereiro de 2020

RESUMO



É preciso fecundar para ser um,
nas águas quentes da placenta reinar,
romper as carnes,  surgir indefeso
na luz primeira, ferir os olhos e gritar
se quiser colo e alimento.
É preciso cair muitas vezes
para andar e se acostumar
que assim será sempre.
Nos tombos é que se aprende.
É preciso o atrevimento
para  ousar expressar  a vontade,
conter a aflição, a ansiedade
de ser grande,  enquanto assim não se vê.
É preciso ansiar os dias
e vencer as noites em claro,
contando que amanhã virá.
Gastar as palavras e a saliva
para que algum entendimento retorne,
remoer as derrotas, cultivar sonhos
e rever planos cotidianamente.
É preciso não se orgulhar dos feitos
e esconder os desejos,
jamais ostentar arrogância e ambição,
engolir na solidão  o fel,
não sobrecarregar teu irmão.
É preciso conter o pranto
e olhar conformado as rugas,
enquanto se degeneram os órgãos
e o sangue se esvai,
experimentar sustos e invasões
e não pensar no que virá.
Voltar ao passado e reconstruir paredes,
rostos e fatos, relembrar vivências de sombras
e falar noites inteiras com os que já foram.
É preciso esquecer nomes, datas, teto,
receitas de bolo, pontos de tricô,
desconhecer fotos em branco e preto,
horários e bichinhos de estimação,
lençóis limpos e coerências.
É preciso condensar o amor sentido
E esgotá-lo em sua grandiosidade
Somente este ficará nas memórias.
É preciso retornar às origens,
teima de que somente somos
um segundo no universo
onde paradoxalmente eternos.
É preciso se perder para se encontrar
e enfim virar cinzas na terra sob o sol.

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