terça-feira, 28 de abril de 2020

PARA UM AMANHÃ


Amanhã dançarei um tango
ostentando um justo vestido preto
com uma fenda sinuosa
mostrando pernas maliciosas.
Permitirei que me filmem
e me nomeiem de um codinome
qualquer feito doida, pode ser.
Nem ligarei se me associarem
a uma Pollyanna contemporânea.
Amanhã aceitarei quem me ama
e o seu cuidado salvador,
me deliciarei em delírios
sonhados ao som de Barry White,
afrouxarei os braços para me guiar
e para onde a estrada nos levar.                            
Amanhã dispensarei as roupas
que inventei para me fantasiar
com ares respeitosos de senhora.
Ornarão agora somente as saias coloridas
que combinam com guirlandas floridas.
Amanhã escolherei um dia todo
para abraçar minhas crianças,
guerrear com almofadas, cantar no chão,
fritar bolinhos de chuva
e costurar vestidinhos para as bonecas.
Em volta à mesa, riremos de tudo
e de quando dividíamos bolachas recheadas.
Revirarei todas as lembrancinhas e fotos antigas
e pendurarei nas paredes. Porque a memória
só guarda o sentido e poucos detalhes
e aprisiona a menina nos álbuns amarelados.
Amanhã não quero fazer contas.
Danem-se planejamentos e contenções,
nem economizarei para me fazer feliz.
Percorrerei milhas no mato e tocarei
o orvalho das folhas e aspirarei
o frescor das flores miúdas.
Amanhã não terei dó de rasgar papéis.
Porque o passado jaz contido
no coração e nos poemas.
Liberarei o espaço para o inusitado,
uma nova história pra contar.
Amanhã farei um bolo confeitado
e com um vinho seco e água com gás
brindarei mais um dia de vida.
Que seja provado enfim o néctar dos deuses.
Abraçarei meus amigos ternamente
- pois esqueço de lembrá-los
como são vivos e importantes
e na nossa rápida caminhada
poucos restam a saber de nós.
Pobres de nós que nos pensamos
eternos e onipotentes...
Amanhã será sempre sonho?

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