sexta-feira, 8 de janeiro de 2021

PRIMEIRO LEGADO AO OUTRO


 

A ti, que passaste por mim,

delego o meu melhor sorriso

consentido em todas as horas

(Não te contarei da tristeza,

guardada a sete chaves

nas entranhas ressequidas)

A ti, que passaste por mim,

transfiro o exasperado fervor

a entregas sem medidas

(Não declararei os recuos,

nem os caminhos tortuosos

e os inconfessáveis ardis)

A ti concedo sem medo

a nudez despudorada

da alma perpetuamente

reciclando e renascendo,

a fé cega nos amanheceres

(As mortes, as levarei comigo.

Incensarei todas as noites

em vigília de exorcismo)

Na querência de plenitudes

corri contigo e pousei suores

em virgens leitos e em pétalas

depositei o calor do alento.

Ouvi e absorvi tuas agonias,

por isso te nomeio herdeiro.

Permite que o meu desejo

se imponha ao teu próprio,

e com a minha sede beberás

e toda a fome será saciada

com o frenesi que pede a vida.

A ti, que passaste por mim,

ostentarei copiosas palavras

prolongadas em desatino,

cravadas em redundância.

Todo êxtase será perdoado.

O fruto inegável, o âmago,

o vivido e o quimérico

do amor gravado no coração,

a ti confiro integralmente.

Eu mesma deserto,

desabito aparatos,

já me abortei de mim.

Eternizo agora em ti.

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