Privilégio
meu, lá pelos idos de 1989, ter participado durante alguns meses de uma oficina
de contos com a coordenação do Caio. Queria
tanto que alguém me amasse por alguma coisa que escrevi, assim registrou.
Dentro dessa humildade e por pensar assim, conquistava as pessoas com bilhetes,
beijos em forma de palavras, apelidos carinhosos. Tudo para ele era intenso, entregava-se
por inteiro. No final do curso, abriu a sua casa para brindarmos, como se
quisesse mostrar tudo de si, além dos livros. No seu apartamento, parecia tudo meticulosamente
escolhido e associado a fortes lembranças, o tapete indiano surrado e colorido
contrastando com a mesa antiga, coberta de cinzeiros atolados de bitucas que se
misturavam aos incensos e pedras coloridas. Nunca vi alguém mais elegante ao segurar o
cigarro, quase um ritual. No parapeito da janela uma azaleia, presente de uma amiga
que também acompanhava a nossa reunião. Mais tarde, eu soube do seu cuidado com a
plantinha e do quanto escreveu para essa filha que ganhou. Era assim, tudo era
importante e atribuía valores místicos. Impossível não notar enquanto fixou seu
olhar demoradamente para a capa de um disco de vinil da Elis, entre Maysa e
Maria Bethania. Parecia recordar de uma grande dor, um grande amor. Dava para imaginar a história que passava por
sua cabeça, olhos vidrados, quase lacrimejando. E de repente, já estava rindo,
feliz como uma criança quando recebe um amigo. Tudo deslumbrava epifania. O
melhor anfitrião que conheci. Todos nós tínhamos em comum a vontade de escrever
e absorvíamos as mínimas mensagens que generosamente o mestre nos doava. Incentivava-nos demais, por ele todos deveriam escrever, tão apaixonado era pela sua arte. Caio
F, com muita simplicidade, nos prestigiou com emoção e intensidade, da mesma
forma que viveu, intensamente. Foi dessa forma que me importei mais com o meu
trabalho enquanto escritora, e também
desejei ser amada através das minhas palavras.
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